Como educador que atua no turismo educacional, tive uma experiência riquíssima nesta semana, ao acompanhar alunos do Ensino Médio do Colégio Progresso Vinhedo ao Teatro Maria Della Costa, em São Paulo, para assistir à peça Memórias Póstumas de Brás Cubas, uma adaptação realizada pelo Grupo RIA da famosa obra de Machado de Assis. Numa época em que as facilidades tecnológicas, muitas vezes, substituem as formas mais tradicionais de cultura e diversão, como o teatro, confesso que me surpreendi com o número de alunos que aderiram a ideia de ir à São Paulo assistir a uma peça baseada numa obra clássica da literatura nacional, normalmente associada por eles aos vestibulares.
Em minha história profissional, como professor de Artes, psicopedagogo e gestor educacional, já tive a oportunidade de trabalhar com o teatro na educação. Foram experiências gratificantes na utilização de jogos teatrais em aulas de Artes, na utilização da dramatização no apoio a alunos com dificuldades de aprendizagem e na direção de peças em festivais de teatro estudantil, com participação ativa dos alunos em todas as etapas do processo, incluindo a produção do texto. Considero o teatro uma ferramenta importantíssima na educação, tanto no desenvolvimento de comportamentos e competências pessoais como na consolidação de aprendizagens relativas aos conteúdos trabalhados em sala de aula.
O fazer teatral, entretanto, não é a única forma de utilizar o teatro na educação. O potencial educativo das encenações teatrais é explorado desde a Antiguidade. Courtney considera que o teatro, enquanto encenação, é “a maior força unificadora e educacional no mundo ático” (1980, APUD HANSTED & GOHN, 2013, p.200). Já o romano Horácio, em sua Arte Poética, “considerava que o teatro deveria tanto entreter quanto educar” (IBID, p.201). De lá para cá, o potencial educativo do teatro foi utilizado, entre outros, pela Igreja Católica durante a Idade Média, por igrejas protestantes após a Reforma, por instituições escolares europeias após a Renascença e por padres jesuítas da Companhia de Jesus.
Na época atual, ambas as formas de utilização do teatro na educação, o fazer e o apreciar, são considerados importantes ferramentas para uma educação integral. Segundo a Cooperativa de Teatro Educativo Oscar Felipe (2019), “na medida em que o teatro engloba todas as demais artes, cria condições para [a] ampliação do campo psicológico e se constitui em elemento importantíssimo na formação intelectual, ética, moral, artística e social do jovem do século XXI”.
Voltando ao estudo do meio realizado nesta semana, destaco alguns pontos que marcaram essa experiência. Em primeiro lugar, destaco o excelente comportamento dos alunos do Progresso Vinhedo. É muito bom acompanhar alunos tão educados e conscientes de seus limites, direitos e responsabilidades. Isso mostra o ótimo trabalho realizado pela escola e também a ótima educação dada pelas famílias dos alunos.
O ponto principal, entretanto, foi a própria encenação. Todos os possíveis receios sobre uma peça chata, comercial, voltada para a preparação para o vestibular, em complemento ou substituição da leitura da obra original, foram desfeitos assim que a peça começou, com Canto para minha morte, de Raul Seixas, abrindo a excelente sonoplastia. O espetáculo foi vibrante e intenso, prendendo a atenção de todos do início ao fim, sendo merecidamente aplaudido em pé pela plateia.
Como complemento à apresentação, o diretor José Paulo Rosa conversou com a plateia, falando sobre a obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, que introduziu o Realismo no Brasil, e sobre Machado de Assis, provavelmente o maior escritor brasileiro. Segundo ele, o autor trabalhava com temas comuns e, em seu estilo próprio, “entra no íntimo do ser e extrai os temas obscuros: a crueldade, o bem e o mal, a morte, a ingratidão, o adultério, o egoísmo e a vaidade” (Grupo RIA, 2019), trabalhando as ações humanas com maestria única e inconfundível.
O melhor de tudo é que não foi um simples monólogo, uma apresentação acadêmica de autor e obra, houve uma verdadeira interação entre diretor e plateia. Vários alunos fizeram questionamentos e apontamentos pertinentes e relevantes. Foi um aluno, inclusive, quem apontou a música de Raul Seixas na sonoplastia, que se encaixou de forma tão brilhante no espetáculo. Esse fato mostra um outro aspecto que ainda não mencionei, o excelente trabalho da professora de Literatura Cláudia Melisce Martins, que além de preparar os alunos para a ocasião, os motivou de forma tão intensa que a adesão dos alunos foi muito acima do esperado.
Enfim, ir ao teatro com os alunos do Colégio Progresso Vinhedo foi uma deliciosa experiência, intensa, rica e bastante educativa para todos os envolvidos. Foi muito bom ver os alunos encantados com a experiência e manifestando o desejo de voltar à São Paulo para assistir a mais peças do Grupo Ria. Agradeço imensamente à confiança da escola, particularmente da diretora Luciane Moura e da coordenadora pedagógica do Ensino Médio Idelli Nichele, em confiar este estudo do meio à Griffe de Viagens. Agradeço, também, as professoras Cláudia Melisce Martins, de Literatura, Gabriela Barbosa, de Gramática, e a monitora Maria Helena Paolillo Costa Sakurai, que nos acompanharam durante a viagem. Finalmente, agradeço ao Grupo RIA pelo trabalho excepcional. Foi uma experiência marcante em todos os sentidos!
Aleksandro Figueiredo
Coordenador de Turismo Educacional
Referências Bibliográficas
Cooperativa de Teatro Educativo Oscar Felipe. A escola indo ao teatro e o teatro indo à escola. Disponível em: http://www.teatrooscarfelipe.com.br/proposta%20teatro%20oscar%20felipe.html. Acesso em: 6/4/2019.
Grupo RIA. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Disponível em: http://www.gruporia.com.br/bras_cubas/index_bras_cubas.html. Acesso em: 5/4/2019.
HANSTED, Talitha Cardoso & GOHN, Maria da Glória. Teatro e educação: uma relação historicamente construída. EccoS Revista Científica, n. 30, p. 199-220, jan.-abr. 2013.